novo dia dedicado ao trabalho
A voz de quem tem fome <br>e sede de justiça
Perante um auditório completamente cheio no Centro de Cultura e Congressos de Aveiro, Edgar Silva terminou a campanha de quinta-feira, 14, a falar de justiça – no combate à exploração e na redistribuição da riqueza, na defesa da democracia pela assumpção da soberania como factor de progresso económico e social e pelo combate à corrupção.
Edgar Silva qualificou a corrupção de «cancro da democracia»
Depois de um dia passado a dar visibilidade ao mundo do trabalho (ver caixa), o candidato à Presidência da República esteve, faz hoje uma semana, à noite, em Aveiro, para um comício de sala repleta. A jornada focada na realidade laboral impunha a consolidação de algumas ideias-chave que Edgar Silva tem procurado acentuar. Assim, lembrando o apoio manifestado por um trabalhador e representante dos trabalhadores na PSA em Magualde, o candidato frisou que aquele traduz o reconhecimento de que a sua propositura à mais alta magistratura da nação é promovida por quem «não está só com os trabalhadores quando há eleições e porque há eleições».
Por outro lado, prosseguiu, os contactos com trabalhadores à porta de empresas permitiram «constatar a intensificação da exploração». O candidato deu como exemplo o caso de um jovem que na PSA lhe disse estar à espera que a multinacional francesa lhe desse trabalho. Esta situação, salientou, ilustra as «novas praças de jorna» que proliferam em Portugal. «Há trabalhadores à porta das empresas a mendigar um contrato precário», lamentou.
«Ninguém que tenha um coração de carne» pode ficar indiferente, disse ainda. Exige-se, por isso, compromissos e acção, os quais Edgar Silva assume com orgulho, nomeadamente a defesa dos preceitos constitucionais em defesa do trabalho e dos trabalhadores.
Combate decidido
O candidato à chefia do Estado não se limitou, no entanto, a relembrar temas sobre os quais tem colocado acento tónico. Depois de reclamar uma maior redistribuição dos rendimentos entre capital e trabalho como factor de desenvolvimento, bem como a necessidade de investimento público – mesmo que isso obrigue afrontar constrangimentos à soberania, casos da dívida e dos juros sobre a mesma, frisou –, Edgar Silva abordou a questão da corrupção.
Ao fenómeno, chamou de «cancro da democracia». Daí ter considerado que o Presidente não pode ficar impávido e sereno perante «tantos casos», sobejamente conhecidos, de titulares de cargos públicos que «estão na mesma hora nas empresas, nas grandes negociatas, na repartição do bolo do Orçamento», e «no Parlamento ou no Governo, na repartição dos dinheiros públicos, na usurpação do bem público».
Para além de uma malha mais apertada àquela promiscuidade, designadamente através de um regime de incompatibilidades mais firme e rigoroso, Edgar Silva avançou com outros eixos centrais que importa aplicar sobre a matéria: combate ao crime económico e financeiro; fim do sigilo bancário, regime que titulou de «armadura de opacidade das traficâncias»; fim dos paraísos fiscais e dotação de meios adequados e suficientes para a investigação judicial, assim como a garantia da independência da Justiça face ao poder político.
«O combate à corrupção não pode ser uma figura retórica», realçou, antes de deixar aos presentes um impressivo apelo para que se «ergam na procura daqueles que têm fome e sede de justiça».
Presidente não pode ser indiferente
Edgar Silva começou o dia de quinta-feira, 14, em Magualde, distrito de Viseu. À porta da PSA durante a troca de turno, o candidato à Presidência recebeu o apoio de muitos dos que ali trabalham. Uns mais efusivos, outros, a maioria, mais resguardados, recebendo o documento das mãos do candidato.
O destaque da iniciativa vai porém para o coordenador da Comissão de Trabalhadores e dirigente sindical naquela unidade produtiva, para quem é justo reconhecer quem defende os trabalhadores e, por isso, manifestou o seu apoio àquela candidatura.
A única que viu à porta de um local de trabalho, acrescentou Jorge Abreu, 39 anos, que aproveitou a ocasião para denunciar o que se passa na empresa. Ali já laboraram cerca de 1300 trabalhadores. Hoje são cerca de 750. Ao nível da produtividade do trabalho, em pouco ou nada os operários portugueses ficam a dever aos espanhóis ou aos franceses. No entanto, os salários são metade do que auferem uns, e um terço do que ganham os outros.
É evidente que o mesmo trabalho realizado por cerca de metade dos trabalhadores leva à imposição de «ritmos brutais, insustentáveis», acrescentou.
Na PSA em Mangualde, a imposição do banco de horas é um dos instrumentos de desregulação laboral de que se socorre o patronato para aplicar jornadas que impossibilitam a conciliação da vida laboral com a vida familiar. Outro instrumento é o cutelo da precariedade e a ameaça de deslocalização que pende sobre a cabeça dos trabalhadores, referiu também.
Escravatura do Século XXI
Congratulando-se com o apoio expresso pelo operário e representante laboral da PSA (por sinal, presidente de uma Junta de Freguesia no concelho de Nelas, eleito nas listas do PSD), Edgar Silva sublinhou que o que sobressaiu na iniciativa foi a confirmação da intensificação da exploração nas empresas e locais de trabalho. Por isso é fundamental colocar na ordem do dia que «não estamos no tempo das praças de jorna», que «um trabalhador não é um escravo. Tem direitos de participação política, social e cultural», os quais «têm de ser garantidos e efectivados na vida concreta».
Ao final da tarde, já em Ovar, à porta da Yasaki Saltano, Edgar Silva, em mais um contacto com trabalhadores, pôde constatar que na vida daqueles operários, quase tudo o que parece é de facto violento – os ritmos de trabalho sempre maiores; o mês que sobeja ao salário de 600 euros; os contratos ao mês, por exemplo, ou a permanente ameaça de despedimento; os torniquetes apertados por onde têm de passar em passo acelerado não vá o transporte deixá-los apeados, acrescentando mais um obstáculo no cumprimento das mil e muitas tarefas quotidianas que ainda há para fazer.
À porta da fábrica, encontrámos um ex-trabalhador despedido... por protestar. E com toda a facilidade porque estava precário, corroborando a razão que tem Edgar Silva quando considera que a desregulação das relações laborais deixa os trabalhadores vulneráveis a represálias por «manifestarem opinião política» ou integrarem «iniciativas reivindicativas».
Pode então um Presidente da República que jura cumprir e fazer cumprir a Constituição ficar indiferente?